quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Você é o que você criou. Mas cuidado.

Certa vez li uma frase num livro que formalizou muita coisa que sempre pensei, mas nunca soube expressar em poucas palavras:

“Meu sonho é acordar num belo dia e não saber quem eu sou, assim eu poderia ser quem eu quisesse.”

Essa fodástica epifania foi extraída do livro De Frente Para o Sol, do psiquiatra americano Irvin Yalom.
Nem foi ele quem criou isso, mas se recordou de um amigo que lhe disse isso e fez a citação sabiamente.

O livro fala sobre a morte e nossa relação com ela, mas é sobre personalidade que quero falar, que criamos diariamente. Sim, nós a criamos.
Nosso histórico tem grande influência no que somos hoje, porém, ao tomar consciência de QUEM somos e O QUE somos, é uma opção permanecer os mesmos.
 O ser humano é um ser necessariamente social - para ser, ele precisa coexistir com outros da mesma espécie.
Tudo o que você possui, pensa, faz, fala, veste, fode, diz quem você é. Reclamar que te chamam de ogro e continuar arrotando enquanto come, é contraditório. Exemplo tosco, OK, mas serve para tudo o que dizem sobre nós. Costumamos ficar infelizes sobre certas características que possuímos, mas se você analisar como tais características foram se formando, verá que quem as criou foi você.
Sentir que não é tratado como adulto pelos pais, a namorada dizer que não se sente segura quanto ao relacionamento, não ser promovido no emprego, são exemplos muito comuns que você já deve ter passado e, mesmo considerando as variáveis que poderiam negar os fatos, você se incomodou.

Para mudar este quadro, você precisa avaliar alguns pontos olhando de fora:
Quem é você? Bem humorado, irresponsável, culto, nerd, fútil, fresco, ogro, otário, bonzinho?

Agora, olhando pra dentro:
Quem eu quero ser? Bem sucedido, informado, poliglota, malhado, intenso, feliz?

Senhores, senhores (!), muito cuidado. Minhas palavras de livro de auto-ajuda fazem muito sentido, certo? Creio que sim. Atingem a maior parte das pessoas, que se identificam e vão no embalo da ideia. É assim que ficamos cada vez mais distantes de nós mesmos: seguindo tendências sem pensar. O pior é que ler essas coisas é algo atraente, tem uma cara de bote salva-vidas que não podemos deixar passar. É uma maneira de nos sentirmos seguros e parte de algo, que seja de um grupo de pessoas que sentem as mesmas coisas que nós. Na verdade, não menti em momento algum, realmente quase todos nós passamos por isso e temos vontade de ser pessoas melhores.

O perigo acontece quando chamamos nossas características de defeitos, nossos costumes de obsoletos e nossos valores de imorais, só porque alguém disse que é assim e pronto.
Temos infinitos meios de análise: os retiros, terapia, reflexão constante, meditação, etc. A lista é enorme e cada um pode escolher com o que se identifica mais, mas uma coisa é fato: relaxe um pouco com o que dizem e busque aí dentro o que realmente te incomoda, o que você é capaz de mudar e o que precisará se adaptar para continuar sendo. Não adianta ser alguém que você não dá conta de sustentar por muito tempo. 

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

As eleições são justas, sim!

Já virou clichê falar mal dos políticos, assim como das pessoas que os elegem, mas eu gostaria de publicar o meu relato. Tive a infelicidade de trabalhar como mesário por seis vezes, sendo que uma delas foi aquele plebiscito sobre o desarmamento. Digo infelicidade porque fui obrigado a acordar muito cedo nos domingos de eleição e passar 10 horas no meu posto de trabalho gratuito involuntário.
Admito que fui uma dessas pessoas que diz que é um absurdo eleger uma pessoa ignorante, analfabeta, ladra etc., mas ser mesário me fez mudar meu ponto de vista. Me fez entender que, por mais que ache estar longe de ser alguém que ganha um excelente salário, more em um ótimo bairro, faço parte da elite falsa moralista brasileira. E não precisa muito para isso, basta ler e escrever sem dificuldade e estar minimamente informado sobre as notícias importantes do momento, além de ter um emprego dito decente.
No meu posto, tínhamos aproximadamente 400 pessoas para votar, mas geralmente 300 compareciam. Posso afirmar que menos de 30% estavam conscientes do voto, o restante acabava encontrando diferentes meios de decidir em quem votar. Não foram poucas as vezes que as pessoas perguntavam para nós em quem deveriam votar. Obviamente éramos proibidos até de dizer nome de candidato, mesmo a pessoa sabendo seu número.
Até aqui, pareço seguro de que a culpa de termos políticos incompetentes é do “povão”, certo? Mas esta é uma opinião que ainda não consegui definir, talvez por ser uma questão que anda em círculos em que o político se apropria do dinheiro direcionado para a educação, por exemplo, o povo continua ignorante e, por conseqüência, volta a elegê-lo, por falta de informação.
Mas o que não consigo entender é porque o povo continua votando nas mesmas pessoas se elas sofrem durante 4 anos! Sempre imagino que nas próximas eleições as pessoas vão se lembrar das dificuldades que passaram com os serviços públicos: as horas esperadas na fila do hospital, professores analfabetos, servidores públicos constantemente em greve, transporte público vergonhoso, entre vários outros. Mas acho que a memória some quando ela entra na sala de votação e o que vem na cabeça é: “E agora, em quem eu voto? Afinal, é obrigatório.” e o primeiro nome que vem na mente, é o que ela vota. O problema é que esse nome surgiu em seu pensamento provindo de notícias sobre escândalos, ou no boton mais bonito que ela recebeu antes de entrar na escola em que vota, distribuído ilegalmente, a famosa Boca de Urna. Depois de ser mesário que eu entendi a importância da Boca de Urna.
A pessoa define boa parte de seus próximos 4 anos de acordo com o Marketing que envolve um nome ou um número.
No final das contas, acabo acreditando que o povo tem sentimentos sádicos mesmo, talvez para ter assunto para falar, ou preencher lacunas nos noticiários. O que eu sei é que eu mesmo, elite intelectual brasileira, não sei em quem votar, por falta de interesse, ou até mesmo falta de credibilidade nas informações que são publicamente divulgadas.
Eis que você, caro leitor, pensa: “Então pra que ele criou este post?”. Eu explico. Acho que devemos expor nossas dúvidas para que outras pessoas que pensam de forma parecida sintam que não são as únicas e, por algum motivo, crie ou descubra uma maneira de resolver este problema. Sou a favor dessas ONGs que promovem discussões sobre política, mas o fato de já serem partidárias me incomoda, mesmo achando difícil que exista alguma entidade apartidária. Aliás, tomar partido é se inteirar sobre as propostas dos candidatos, mas com o tempo que precisamos perder por causa dos problemas que temos com os serviços públicos, a vontade que resta é chegar em casa e assistir a minha TV a cabo elitista. 

quinta-feira, 28 de junho de 2012

McDonald's, um refúgio para os rejeitados


Todo mundo já foi pelo menos uma vez ao McDonald’s. Eu frequentei durante anos e ainda vou de vez em quando, mas este post não é para falar mal das refeições ou da dominância da empresa no mercado e sim para falar sobre seus funcionários. Grande parte do quadro é composta por homossexuais, negros, obesos, etc.. São pessoas bem jovens, a partir de 16 anos e costumam ser bem pobres. 
Por mais que pareça que vou falar mal da rede, na verdade estou aqui para refletir sobre o porquê de eles irem parar na frigideira fritando batatas fritas à 260° ou limpando o chão do salão da lanchonete. Não é à toa que pagam mal, afinal, o trabalho não exige grandes conhecimentos, apenas necessidade absurda de trabalhar. Por mais “inclusivas” que a maioria das empresas se intitulem, não há espaço para essas minorias. Existem cotas para deficientes, fato já abordado em um post aqui, mas não existe uma cota para as minorias citadas. Aliás, minoria só no nome, porque no Brasil creio que a maioria em quantidade seja de pessoas negras, além da obesidade que vem tomando conta do país continuamente e a crescente revelação de homossexualidade na sociedade. 
Mas o que define o que é minoria? A quantidade de pessoas ou a rejeição da sociedade? É certo pensar que, se não existisse o McDonald’s, essas pessoas estariam desempregadas, mas se a maioria das empresas não fossem preconceituosas, o McDonald’s seria obrigado a igualar as condições de trabalho, assim como todas as outras que exploram seus funcionários. Às vezes chego a acreditar que eles não melhoram a qualidade nutricional de suas refeições para que as mídias sociais continuem com o foco nisso, ao invés de olharmos por detrás dos balcões. 
Eu usaria esse “olhar por detrás dos balcões” para elucidar outra coisa. Usamos aparelhos construídos por trabalhadores chineses que estão em condições piores das dos funcionários de fast food, constantemente se suicidam do alto das torres das fábricas e só queremos saber de ter o celular mais moderno. Crianças morrendo de fome na África, terra explorada, literalmente. Colonizadores chegaram, sugaram, mataram e foram embora, deixando o povo armado e jogado. O nosso Nordeste! A periferia! Não precisamos ir muito longe. 
(Só um comentário a parte, quem pede anarquismo deveria primeiro olhar como alguns países africanos estão sem um governo estruturado. O caos é grande com governo, mas sem, é o caos completo, pois o ser humano não está pronto para mandar no seu próprio nariz.) Bem, o que quero dizer aqui é que atrás do balcão estão pessoas invisíveis, pessoas que não queremos ver os rostos para não nos sentirmos mal com o nosso egoísmo. Queremos Big Mac, não saber quem queimou as mãos fazendo.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Vale Tudo, o Poder do Consentimento

O Vale Tudo basicamente é uma demonstração de força, seja física, mental ou técnica. Quando eu era adolescente, costumava assistir e ficava impressionado com a violência, mas impressionado num bom sentido, eu realmente gostava de ver os lutadores se espancando, sem saber porque. Após alguns anos assistindo, comecei a tentar entender por que eu gostava disso, ver um ser humano causando dor a outro ser humano. Cheguei a achar que eu era sádico, mesmo não sendo eu o causador do sofrimento. Ou será que eu era o causador de tanta dor?

Pensando logicamente, estes eventos precisam de patrocínio, e para isso, precisa-se de uma quantidade razoável de público assistindo, eu, no caso. Indiretamente, o sofrimento causado dentro do ringue é causado por quem assiste.

Acredito que a sociedade nos pressiona e irrita tanto, que quando podemos extravasar, aproveitamos, mesmo que seja apenas nos deleitando com sofrimento alheio. Sim, as pancadas distribuídas são de quem está assistindo, eu e todo mundo que assiste está espalhando violência na mídia. Assim como muitos outros eventos (filmes, jogos de videogame, programas de TV, até mesmo os noticiários que selecionam as notícias de acordo com o interesse do público), mas vou focar neste porque acredito que seja o mais cru de todos, o contato direto entre duas pessoas em um pequeno espaço físico e de tempo, com objetivo de definir quem é o mais forte.

Falando assim até parece que estamos falando da lei do mais forte da natureza, dos machos Alfa e das espécies mais agressivas e estratégicas. A supervalorização do masculino na sociedade pode ser o motivo para tanto sucesso do Vale Tudo, aliás, o nome diz tudo, pode-se usar de várias maneiras de destruir o outro, não vale tudo realmente, mas a conquista é baseada em quem conseguiu usar a melhor técnica, munida de força. Aplicando essa idéia no cotidiano, o dinheiro é uma das melhores estratégias de conseguir ser o melhor num grupo.

Em geral, estas lutas são assistidas por maioria masculina, claro que os hormônios estão ligados a este fato, mas entendo que precisar admirar um homem que destrói outros reflete na vontade que os homens têm de se sobrepor na sociedade, de vencer, de se ter sucesso, de se ter uma ereção, de pagar as contas, porque são cobrados disso por tudo e todos. A lista é bem longa, mas o básico da minha linha de pensamento se baseia no limite a que os seres humanos precisam chegar para impressionar outros, ou nesse caso, se impressionarem.

Além disso, tem algo muito importante que ainda não citei, que sem ele não seria possível haver o Vale Tudo: o perdedor. O título deste post é o início de tudo. O principal motivo de não sentirmos culpa ao assistir alguém apanhando até dizer chega (literalmente) e incentivar isso, é o fato deste indivíduo estar lá porque escolheu estar. Não importa quais os motivos dele, se quer ser o melhor lutador, se é um sonho de criança competir, se quer provar algo à alguém, se precisa muito do dinheiro para o transplante de rim do pai, o que interessa é que ele permitiu que alguém batesse nele para que possamos admirar.

O pior de tudo? Eventualmente eu ainda assisto e não consigo efetivamente achar ruim!  E é pior mesmo, porque sinto que cheguei tão perto de encontrar alguma resposta, mas não consegui. Não consegui vencer a luta com a minha mente, ou talvez realmente vivemos em uma sociedade sádica, que ri quando vê alguém tropeçando na rua, que torce pra patinadora errar e escorregar no gelo, que aguarda os melhores momentos da corrida de carros para ver um possível acidente. Ora, se a maioria é assim, então estatisticamente estou dentro da normalidade.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Deus

Eu sempre escrevi Deus com letra maiúscula, simplesmente porque sempre via escrito assim. Há alguns anos questionei isso e parei de usar o D maiúsculo, por pensar que a escrita foi inventada pelo homem e, se foi este quem criou este respeito por Deus, eu não me vi na obrigação de escrever assim, uma letra não define meu respeito por algo ou alguém e sim a minha crença. Recentemente, pensando melhor, decidi usar novamente com letra maiúscula, não por respeito a ele, mas porque é um nome próprio, pensando em regra gramatical mesmo.

Isso parece uma discussão besta, mas pensar sobre esta questão, ainda na adolescência, me fez questionar a existência de Deus. Não que eu ache que ele não exista, mas eu questiono essa forma que as grandes religiões criaram. Não consigo imaginar um homem barbudo que mora no céu e que criou o homem à sua imagem, muito menos representado por um homem “iluminado”. A maioria das religiões pregam idéias semelhantes: Deus é onipresente, onisciente e onipotente. Ora, se ele é tão perfeito, como teria criado uma espécie com tantos defeitos como a nossa à sua imagem? Pode até ter criado, mas esta teoria se contradiz na essência e prova que não se inspirou nele próprio.

Analisando as definições:
Onipresente: se ele está em todos os lugares, ao mesmo tempo e em todas as formas, não deveria existir templos religiosos sagrados, afinal, se ele está em todo canto, todo canto é sagrado. Outra coisa é rezar olhando pra cima, não faz sentido!

Onisciente: se ele sabe tudo sobre nós, uma reza não precisa ser padronizada, nem ao menos falada em voz alta (ou ajoelhado). Pedir desculpas por algo não é necessário, uma vez que ele sabe que realmente nos sentimos arrependidos. Aliás, a culpa é um assunto para uma postagem a parte. Falar sobre ele poderia e deveria ser uma atitude aberta, sem medo de se cometer uma blasfêmia, afinal, se você disser ou não em voz alta, ele já sabe o que você pensa!

Onipotente: deixei este por último porque resume a minha indignação com pessoas que acham que têm algum poder sobre Deus. Sim, foi isso o que eu disse, muita gente acredita que pode ser abençoada, punida ou até mesmo santificada por ele, mas não enxerga que quem faz isso são os homens, eles que escolhem o que vão fazer com a humanidade (o nome é auto-explicativo). Se Deus quisesse, já teria melhorado o mundo há muito tempo. E pare de dizer “se Deus quiser”, porque se você acredita nele neste formato, você deveria acreditar também em livre arbítrio, ou seja, por essa lógica, quem faz o seu destino é você. Ah não? O destino já está escrito? Pior ainda, se já está escrito, não precisa se preocupar em mudar alguma coisa.

A maioria das religiões se baseia em fatos históricos, em escrituras que foram feitas há muitos anos. Se, com a globalização com uma quantidade absurda de meios de comunicação, temos dificuldades em saber a verdade de um fato, imagine com fatos que aconteceram há milhares de anos e poucos eram os que sabiam ler e escrever (geralmente, os poderosos). Na minha opinião, se registrava apenas o que interessava na época. Não tenho dúvida de que Jesus, Buda, Moisés e semelhantes eram seres além de sua época, mas a demanda do momento era muito específica, estava-se em busca de uma salvação, não importa de onde viesse. Sei que Budismo não é religião e sim uma filosofia, mas se atribui religiosidade quando se fala a respeito do Buda. Em minha humilde opinião, Leonardo da Vinci deveria ser contemplado como um desses, seguindo este raciocínio.

Enfim, este é um assunto para mais posts, mas resolvi começar com Deus, na minha opinião, a base de todas as religiões, independente da imagem a qual lhe é dada.
É muito difícil ser cético e acreditar que este universo em que vivemos surgiu do acaso num Big Bang da vida, e que a evolução cuidou de tudo sozinha, sem dono, porém é mais difícil ainda acreditar nas religiões do jeito que são.
Eu acredito que alguma força rege sim o mundo, só não sei ainda se nomeio de Deus, Natureza, força sobrenatural ou algo do tipo, o que sei é que nós, os homens, somos seres insignificantes no universo e, sendo assim, não temos capacidade para entender algo tão grande, temos capacidade apenas em ter fé, ou seja, achar. É o que estou fazendo aqui, questionando, mas tendo a humildade de admitir que não tenho certeza de nada. Já é um bom começo.

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

A Deficiência Física

Este é um tema complexo, tanto do ponto de vista ético e moral, quanto sócio-histórico. Vou tentar desmantelar tanta explicação e resumir em alguns parágrafos como entendo o assunto, porque me considero inocente o suficiente para poder opinar sem me sentir mal. Digo isso porque acredito que a sociedade impôs de tal maneira que tenhamos cuidado ao falar sobre qualquer tipo de deficiência física, que sempre achamos que estamos falando algo errado. Acredito que esta cultura até tenha seu mérito.
A minha tia é cega, não enxerga nadinha. Sempre foi difícil entender o mundo em que ela vive, realmente porque é o que parece, outro mundo. Acredito que a cegueira é uma das deficiências mais temidas pelas pessoas, talvez porque a modernidade está nos deixando dependentes da estética. Aliás, acho que estética é o ponto chave para se discutir a deficiência. Não consigo imaginar um cego com preconceito em relação a alguém que tem uma deficiência “visível”. Acho que o que mais incomoda é nos imaginar na posição do outro, então preferimos não olhar para nem pensar.
O preconceito ainda é o mesmo, com a diferença que não se pode falar sobre ele. Não tenho uma maneira melhor para lidar com isso como sugestão, mas não concordo com o modo que é feito. Obrigar empresas a contratar pessoas nessa condição, mas não dar suporte educacional lá atrás, é a mesma coisa que obrigar alguém a cozinhar, dar os ingredientes, mas sem dar a receita. Mas as pessoas que enfrentam tantas dificuldades por muitas vezes conseguem tirar proveito da situação e criam receitas próprias, com muito mais sal, açúcar e pimenta! Que bom que o ser humano tem o dom de conseguir se superar!
Eu acho interessante como é difícil tentar imaginar a vida sendo um deficiente físico. É simples entender como um cadeirante se sente em frente à uma escada do ponto de vista prático, mas imaginar que por anos ele se confronta com isto, é praticamente impossível, o impacto é totalmente outro. Pequenas mudanças já dificultam sentir a pele do outro, como um grau de miopia, uma perna um centímetro maior que a outra, 5 quilos a mais... enfim, estes são alguns motivos que me fazem acreditar que a deficiência física é apenas uma pequena diferença, mas que pode ter conseqüências de grande intensidade em quem as possui. Já vi casos de pessoas que não conseguem mover nenhum dos membros, mas que “sentem” menos falta do que alguém que não move um único membro. É muito complicado entender o tamanho da ferida de outra pessoa, por isso não me dou o direito de tentar descobrir o que é pior ou não, mas sim entender o porquê de tentarmos o tempo todo fazer isso. Talvez esse tipo de pensamento ajude a diminuir o preconceito.
O que acontece é que estamos desacostumados com o diferente, além de termos uma cultura de precisar achar uma resposta pra tudo, então sempre corremos atrás de fatos que nos mostrem como não somos preconceituosos. Isso pode acarretar em um sério problema, pode-se pensar que, só porque certa pessoa tem uma determinada deficiência, ela necessariamente precisa de ajuda o tempo todo, para fazer qualquer coisa. É com bastante freqüência que pessoas com deficiências apenas físicas sejam “atrasadas” em seu desenvolvimento psíquico, porque a sua aparência gera, de alguma maneira, dó e necessidade de assistencialismo.
Por muitas vezes, são pessoas adultas, com comportamentos infantilizados, por culpa de quem as cerca. O problema é que a família é a base da educação para muitas pessoas com deficiência, porque a própria casa é onde se passa maior parte do tempo, devido à dificuldade de locomoção pela cidade. Há uma quantidade enorme de discussões a respeito da educação, se a escola tem direito ou obrigação de educar um cidadão, mas nesse caso, acredito que a família sem orientação age da mesma maneira ou pior na educação de seus filhos com necessidades especiais. Aliás, este nome Necessidades Especiais acho que resume bem o que estas pessoas precisam. Quando digo que posso opinar sem me sentir mal, não quer dizer que não sinto nada. É muito complicado escrever para um mundo onde tudo precisa ser politicamente correto, ao menos na hora de publicar algo. O preconceito existe sim na cabeça de todos, com a diferença que existe reconhecimento ou não.
Quando me refiro a “essas pessoas” admito que me sinto mal, mas ao mesmo tempo percebo que isso é preconceito de minha parte, uma vez que eu falaria normalmente assim sobre outras classes de pessoas, altas, baixas, gordas, magras, etc. O fato de saber disso, já me é de grande alívio e sinto-me livre de boa parte de culpa. Principalmente porque escrevo com admiração dos deficientes físicos.
Algumas pessoas conversam sobre as deficiências, mas “escolhendo” qual tipo preferiria ter e por quais motivos, pra passar o tempo mesmo. Eu já acho que isso é impossível, assim como a história do cadeirante em frente a uma escadaria. Não é fácil saber o que nos aflige, imagine sobre o outro!